segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Begônias




Foi como se tivessem deixado um bebê na minha porta. De repente, entre os talos da begônia que eu vinha conservando com displicente carinho desde o começo do ano, despontou um tímido esboço de flor, uma coisinha mínima e delicada… E eu não sabia o que fazer!

Mas essas coisas são intuitivas, a vida em mim sabe como preservar-se, e fui alimentando a flor de água, luz e atenção, abrindo caminho para ela entre as folhas e cortando até uma ou outra para que a florzinha ganhasse espaço. E logo, para minha surpresa, já não era uma flor, mas duas, bem irmãs, nascidas uma do ladinho da outra, quase gêmeas.

Aí começou minha grande dúvida: corto ou não corto os talos e folhas que durante meses foi tudo o que restara da begônia que em um dia de dezembro do ano passado chegou aqui esfuziante de flores que foram fenecendo uma a uma até só restarem os talos vestidos de folhas que depois foram se avermelhando, a despeito de todos os meus cuidados, até quase morrer.

Cheguei mesmo a pensar que morreria, mas me esforcei para salvá-la, tarefa que eu sabia revestida de íntimos significados. Eu queria que algo assim tão delicado sobrevivesse contra todos os presságios a custa apenas do meu esforço e do meu carinho. Queria olhar para ela todos os dias e pensar “Eu acredito em você” enquanto lhe enchia de água o pratinho e aparava as folhas já quase mortalmente roxas. Queria que algo restasse, um pouco quadro na parede, um pouco filho.

Teve momentos em que achei que a begônia não queria sobreviver. Em outros, fui eu quem lhe disse “por que não morre de uma vez?”. Mas a vida é mais forte e, desconfio, nossos ódios nunca são sinceros. Por mais que tentemos, fomos talhados para o amor e para vida e a delicadeza nos comove mais do que toda a raiva que a violência é capaz de produzir.

Minha esperança, minha vontade, era que a begônia de novo desse flores como alguém um dia disse que daria. Acreditei. Fiz disso um exercício de fé. Enfim, apesar de mim e meus humores – e apesar talvez da própria begônia – vencemos – a vida em nós venceu.

E, talvez você não acredite, leitor, mas ainda agora, quando passei ao lado dela reparei que, para minha surpresa e encantamento, já não são mais duas flores, e sim, três! Será mesmo preciso cortar as folhas e os talos.


Antonio Caetano

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